Fonte:G1 Foto:David Zalubowski/AP |
Numa vasta instalação militar no
estado americano do Kentucky, um marco está prestes a ser atingido:
trabalhadores do depósito de Blue Grass estão destruindo as últimas armas
químicas dos Estados Unidos, o que acabará com o único arsenal do tipo
oficialmente declarado restante no mundo.
A destruição dos últimos foguetes
remanescentes contendo o produto químico sarin, encerrará décadas de campanha
pela destruição de um arsenal que ao fim da Guerra Fria totalizava mais de 30
mil toneladas.
Armas químicas foram usadas pela
primeira vez numa guerra moderna na Primeira Guerra Mundial, na qual se estima
que essas munições tenham matado ao menos 100 mil pessoas. Apesar de
posteriormente banidas pelo chamado Protocolo de Genebra, assinado em 1925 e
que entrou em vigor três anos depois, países continuaram a estocar armas
químicas durante décadas.
O dia 30 de setembro deste ano
foi estabelecido como prazo para os EUA acabarem com seu arsenal no âmbito da
Convenção sobre Armas Químicas, acordo internacional que entrou em vigor em
1997 e conta com a adesão de 193 países.
No Kentucky estão sendo
eliminados os últimos de um total de 51 mil foguetes contendo o mortal agente
sarin que foram armazenados desde os anos 1940 no depósito, localizado próximo
à cidade de Richmond. Segundo reportagem publicada pelo New York Times, a destruição seria concluída nos próximos dias,
possivelmente já nesta sexta-feira.
Recentemente outra instalação
militar americana, perto de Pueblo, no estado do Colorado, concluiu a
destruição das últimas armas químicas que abrigava, iniciada em 2016. A missão
de eliminar cerca de 2.600 toneladas de projéteis e morteiros cheios de gás
mostarda chegou ao fim no último dia 22 de junho.
Estes representavam cerca de 8,5%
do estoque original de 30.610 toneladas do agente. No total, cerca de 800 mil
munições contendo gás mostarda foram armazenadas desde a década de 1950 em
bunkers de concreto numa área rural ao leste de Pueblo.
Décadas de luta
Na década de 1980, moradores dos
arredores do depósito militar de Blue Grass, no Kentucky, protestaram contra os
planos iniciais de incinerar as 520 toneladas de armas químicas ali
armazenadas, iniciando uma batalha de décadas sobre como acabar com o arsenal.
O Exército dos EUA eliminou a
maior parte de suas armas químicas incinerando-as em locais mais remotos, como
o Atol Johnston, no Pacífico, e um depósito no meio do deserto de Utah. Mas a
instalação no Kentucky fica próxima a Richmond, a apenas algumas dezenas de
quilômetros de Lexington, a segunda maior cidade do estado, e a menos de 2
quilômetros de uma escola.
Craig Williams, que se tornou a
principal voz da oposição popular, afirmou que moradores temiam que a
incineração dos agentes químicos liberasse gases tóxicos. Com a ajuda de
legisladores, a população conseguiu fazer com que o Exército apresentasse
planos alternativos para a destruição.
Armas químicas no mundo
Kingston Reif, que durante anos
fez campanha pelo desarmamento e agora atua como vice-secretário adjunto de
Defesa dos EUA para redução de ameaças e controle de armas, afirmou que a
destruição completa do arsenal químico do país "fechará um importante
capítulo na história militar”.
Autoridades consideram a
eliminação do arsenal americano um grande passo adiante no âmbito da Convenção
sobre Armas Químicas. Somente três países – Egito, Coreia do Norte e Sudão do
Sul – não assinaram o tratado. Israel assinou, mas não ratificou o acordo.
Reif destaca que ainda existe a
preocupação de que países signatários, especialmente a Rússia e a Síria,
possuam estoques não declarados de armas químicas. Oficialmente, a Rússia
destruiu seu arsenal em 2017, após o Reino Unido e a Índia fazerem o mesmo em
2007 e 2009, respectivamente.
A Convenção sobre Armas Químicas
não acabou com o uso desse tipo de munição. Na guerra civil na Síria, forças
leais ao presidente Bashar al-Assad usaram armas químicas no país diversas
vezes entre 2013 e 2019. E de acordo com o IHS Conflict Monitor, organização
baseada em Londres que analisa dados de inteligência, os combatentes do
"Estado Islâmico" usaram armas químicas ao menos 52 vezes no Iraque e
na Síria de 2014 a 2016, aponta reportagem do New York Times.
Ativistas pelo controle de armas
esperam que o marco alcançado pelos EUA possa motivar os países que ainda não
destruíram suas armas químicas a fazê-lo e também ser usado como modelo para a
destruição de outros tipos de munição.
"Isso mostra que países
podem realmente banir armas de destruição em massa", afirma Paul F.
Walker, vice-presidente da Associação de Controle de Armas e coordenador da
Coalizão da Convenção sobre Armas Químicas. "Se países quiserem fazer
isso, é preciso apenas vontade política e um bom sistema de controle."
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