Caso Marielly: Ex-cunhado e enfermeiro são condenados por aborto que acabou em morte
CASO MARIELLY
Fonte: Anahi Zurutuza e Dayene Paz -CAMPO GRANDE NEWS Foto: Paulo Francis
Onze anos depois que Marielly
Barbosa Rodrigues morreu e após julgamento de 11 horas, o ex-cunhado dela,
Hugleice da Silva, 38 anos, e o enfermeiro Jodimar Ximenes Gomes, 51 anos,
foram condenados por causar a morte da jovem, à época com 19 anos, durante aborto
e jogar o corpo em milharal.
Hugleice foi considerado culpado
pelos sete jurados – quatro mulheres e três homens – pelos crimes de aborto e
ocultação de cadáver, pegando pena total de 4 anos de reclusão. Jodimar será
punido com 5 anos e 3 meses. O regime de prisão estabelecido pelo juiz Cláudio
Pareja, para os dois, é o semiaberto.
Dezessete testemunhas seriam
ouvidas durante o julgamento, que começou por volta das 9h30, mas apenas quatro
pessoas deram seus depoimentos. Maria Campos, investigadora da Polícia Civil
que acompanhou as buscas pela estudante em 2011, foi a primeira. Além dela, a
irmã da vítima, Mayara Bianca, que era casada com Hugleice, Luzimara Medeiros
do Amaral, que era ajudante de Jodimar, e William Ximenes Pinheiro, um primo do
enfermeiro, também responderam às perguntas da acusação e defesas.
Ainda pela manhã, Jodimar foi
interrogado e falou por cerca de uma hora. Hugleice só foi ouvido após o
intervalo para o almoço, por cerca de 40 minutos.
O enfermeiro permaneceu quieto
durante todo o júri, mas aparentemente nervoso. Já o ex-cunhado da vítima,
parecia estar mais tranquilo, embora tenha chorado durante o depoimento da
ex-esposa.
No plenário, uma tia, o pai e um
primo de Marielly acompanham o júri desde o começo e se emocionaram em vários
momentos, principalmente quando fotos de como o corpo foi encontrado foram
mostradas em telão.
“A nossa família foi a mesma,
nunca mais. Quando você vê aquelas imagens, volta tudo, Deus me livre. Que a
justiça seja feita, o que você faz aqui você paga”, resumiu a tia, Renata Rodrigues,
o sentimento em poucas palavras.
Não foi fácil para os jurados
acompanharem tantos detalhes sobre um fato ocorrido há tanto tempo. No fim da
tarde, o cansaço era visível. Os julgadores reuniram-se para tomar decisão
pouco antes das 19h e por volta das 20h deram o veredicto.
Defesas – A defesas de ambos os
acusados chegaram ao Fórum de Sidrolândia alegando que os crimes pelos quais os
clientes eram réus já haviam prescrito. Por isso, nem a júri eles deveriam
estar sendo submetidos. A tese foi derrubada pelo juiz Cláudio Pareja, que
tocou o julgamento.
José Roberto Rodrigues da Rosa,
representante de Hugleice, tentou convencer o júri de que o cliente apenas
ajudou a cunhada em desespero com a gravidez e que não participou do aborto.
“Ela foi de vontade própria. Se alguém da família te pede: ‘Me leva? Eu não
quero ter essa criança!’. Você não ajudaria?”.
Nas alegações finais, ele chegou
a citar caso ocorrido em Campo Grande, em que mão julgada por ajudar a filha a
praticar aborto, foi absolvida. “Existia a vontade dessa moça, quase que uma súplica.
Foi Marielly que se sujeitou. Não foi Hugleice quem provocou”.
Já a defesa de Jodimar tentou
plantar dúvida nos jurados, alegando que Hugleice cometeu o crime sozinho e que
não havia feto, portanto, não houve aborto. Mayara, irmã de Marielly, sofreu
violência doméstica e quase morreu nas mãos de Hugleice, anos depois do
ocorrido com a mais nova. Quando a irmã da vítima foi ouvida, o advogado David
de Moura Olindo chegou a questionar: “Você acha que ele teria cortado o pescoço
da sua irmã?” e a testemunha respondeu: “Pelo que passei, eu não duvido”.
Acusação – A promotora Bianca
Machado Arruda Mendes sustentou que havia provas suficientes para condenar a
dupla. Ela mostrou imagens que fazem parte do processo e em sua fala, relatou
que o exame necroscópico levou a descoberta do aborto já que os peritos
constataram que Marielly sofreu hemorragia intensa.
Ela também argumentou que
Hugleice confessou ser o pai da criança que a vítima esperada e depois, voltou
atrás, dizendo que foi coagido, mas admite que foi ele quem pagou R$ 500 pelo
aborto. “Que comportamento é esse de um inocente? Que topou ganhar 500 reais
para fazer um aborto”, questionou sobre o enfermeiro Jodimar.
A promotora ainda colocou
Hugleice como coautor intelectual do crime, porque seria o responsável pelo
planejamento do aborto e alegou que os materiais encontrados na casa de Jodimar
seriam compatíveis com usados em casos de interrupção de gestações.
Há 11 anos – O caso começou a ser
investigado em maio de 2011, como desaparecimento. A mãe de Marielly registrou
boletim de ocorrência no dia seguinte ao sumiço. O então cunhado também tomou
frente nas buscas, mesmo sabendo o que de fato havia ocorrido com a jovem.
O corpo foi encontrado no dia 11
de junho, em estrada vicinal que corta a BR-060, entre Campo Grande e
Sidrolândia. A identificação foi imediata, por conta do aparelho que a moça
usava nos dentes. Uma das pistas iniciais foi pano encontrado, que levou à
clínica clandestina de aborto.
O caso ganhou ainda maior
repercussão, quando foi descoberto que o próprio cunhado era o pai do bebê.
Diante dessa informação, a polícia relacionou Hugleice à ocultação de cadáver.
Com a quebra de sigilo
telefônico, a polícia encontrou ligações entre os dois e mapeou o caminho
seguido por Marielly até chegar à Sidrolândia. Em depoimento, o cunhado
confessou que mantinha relacionamento com a jovem, até que ela engravidou. Em
comum acordo, foram até Sidrolândia para que ela fosse submetida a aborto.
Hugleice contratou o enfermeiro Jodimar, segundo a denúncia, para o
procedimento.
O procedimento foi feito nem uma
casa do Bairro São Bento, mas Marielly passou mal, sofreu intensa hemorragia e
morreu. Em trecho do depoimento prestado à polícia, Hugleice confessou que
recebeu a notícia da fatalidade, dada pelo enfermeiro: “A menina morreu, não há
mais nada que possa ser feito, a gente tem que dar jeito no corpo dela”, teria
dito. Foi quando a dupla decidiu dar fim ao cadáver.
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