Decreto
presidencial assinado por Jair Bolsonaro nesta quinta-feira, 1, incentiva
salas e escolas especiais para crianças com deficiências, transtornos globais
do desenvolvimento, como o autismo, e superdotação. O documento está sendo considerado um retrocesso
nas políticas de inclusão no País e
discriminatório porque abriria brechas para que as escolas passassem a não
aceitar alunos com essas característas. Entidades e parlamentares já se
movimentam para tentar barrar a medida.
"Muitos
estudantes não estão sendo beneficiados em classes comuns", disse o
ministro da Educação, Milton Ribeiro no lançamento ontem da Política Nacional
de Educação Especial, que teve presença do presidente e da primeira-dama
Michelle Bolsonaro - fluente na Língua Brasileira de Sinais e que se apresenta
como defensora dos direitos das pessoas com deficiência. O decreto prevê
recursos para redes públicas que quiserem adotar políticas e também para
entidades, como Apaes, institutos para surdos e outras, que ofereçam educação
especial.
Especialistas dizem que há problemas ainda na inclusão, mas que o foco dos recursos do governo deveria ser o de formar melhor os profissionais e dar mais estrutura para esse atendimento nas escolas regulares, em vez de separar as crianças. Os alunos, no entanto, nunca deixaram de poder estarem matriculados também em serviços especiais. O País também é signatário de convenções internacionais de direitos das pessoas com deficiência que defendem a inclusão como benefício tanto para elas como para criar uma sociedade mais justa e que saiba conviver com a diferença. "Em uma sociedade moderna, isso é inconcebível, é querer separar pessoas em caixinhas.
Temos que trabalhar nas barreiras que impedem essa pessoa de ter acesso e participação no mundo e não em acentuar suas diferenças", diz a coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (Leped), da Unicamp, Maria Teresa Mantoan, sobre o decreto. Para ela, o governo está voltando o País aos anos 90 com políticas como essa. "Os pais dessas crianças não estariam matriculando em massa nas escolas comuns se não fosse bom para elas." Segundo nota divulgada pelo laboratório, o decreto pretende que sejam "ofuscados ou esquecidos os ganhos obtidos pelos alunos que, em razão da inclusão escolar, puderam seguir trajetórias de vida jamais imaginadas no tempo em que eram vigentes no país a concepção que agora o governo federal busca desenterrar". O Leped e outras entidades da sociedade civil estão se organizando para entrar na Justiça contra a medida. Em seu twitter, a deputada deferal Maria do Rosário (PT-RS) também informou que ingressou com um projeto para tentar barrar o decreto do executivo."Quando a gente pensa que está caminhando vem esse retrocesso enorme", afirma a coordenadora de advocacy do Instituto Rodrigo Mendes, Luiza Correa. A entidade sem fins lucrativos defende a educação inclusiva para pessoas com deficiência. Para ela, o governo "perverte" o conceito de inclusão ao dizer que ela acontece em salas segregada com recursos especiais. "É uma incoêrencia falar (no decreto) que vai preparar melhor o estudante para a vida e, ao mesmo tempo, estimular a discriminação. Como ele vai aprender a viver em sociedade depois de adulto?" questiona.Para ela, o governo deveria estar enviando dinheiro para as escolas para ter piso tátil, rampas e formação de professores com didática para lidar com crianças com defiências. "O decreto abre margem para que a escola encaminhe alunos para as instituições em vez de atendê-lo". "Numa sociedade em que as pessoas são diferentes, é preciso que essas diferenças estejam em convívio e possam alimentar umas às outras", diz o jornalista Cassiano Elek, pai de Ulisses, de 3 anos, que tem Síndrome de Down. Para ele, o decreto é uma atrocidade.
"É inimaginável pensar que eu, como pai, não deva lutar para que meu filho possa conviver com os perfis mais variados, é um estímulo vital para ele. Ao conviver com pessoas que tenham mais facilidade para executar tarefas x ou y, ele é estimulado, tem possibilidade de se espelhar em outras crianças". Procurada, a assessoria de Imprensa do Ministério da Educação (MEC) não retornou o pedido do Estadão para responder às críticas. Em seu site, o MEC informa que o objetivo da política é "dar mais flexibilidade aos sistemas de ensino, na oferta de alternativas como: classes e escolas comuns inclusivas, classes e escolas especiais, classes e escolas bilíngues de surdos, segundo as demandas específicas dos estudantes."
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