Brasil| Governo federal quer usar recursos de cadeias na polícia
O
governo federal pretende mudar por Medida Provisória as possibilidades de uso
dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) para passar a prever a
aplicação das verbas em "políticas de redução da criminalidade" e até
no pagamento de diárias a policiais. A medida proposta pelo Ministério da
Justiça e discutida no Planalto prevê ainda a transferência direta do dinheiro
a Estados e municípios, sem necessidade de estabelecer convênios.
O
Funpen foi criado em 1994 e tem como principais fontes de recursos os 3%
oriundos da arrecadação de loterias do governo federal e 50% do total de custas
judiciais recolhidas pela União. Apesar de contar com um saldo relevante - de
acordo com levantamento da ONG Contas Abertas, era de R$ 3,3 bilhões em outubro
-, o fundo enfrenta sucessivos contingenciamentos pelo governo.
A
lei que o criou prevê aplicação das verbas na construção, reforma, ampliação e
aprimoramento de estabelecimentos penais, além de outras atividades de
manutenção. O que o governo federal planeja agora é ampliar essas previsões
para, entre outros pontos, transferir verba para o Fundo Nacional de Segurança
Pública, visando à aquisição de equipamentos para as polícias, como armas e
viaturas.
Na
prática, as mudanças podem dar uma maior margem para ação do Ministério da
Justiça na execução do Plano Nacional de Segurança, que deve ser lançado no
próximo mês. Sem contar com previsão de aumento no orçamento, a pasta poderia
usar com maior discricionariedade os recursos do Funpen, que tiveram o
descontingenciamento ordenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em setembro
do ano passado.
A
Corte entendeu que a situação de precariedade das unidades prisionais não pode
esperar para ser sanada, já que há um déficit de mais de 249 mil vagas no
sistema - o País tem cerca de 622 mil detentos. "Recebo essa notícia com
surpresa. É lamentável que não tenhamos prioridade para o sistema prisional,
que vive uma calamidade, onde os direitos dos presos são sistematicamente
desrespeitados. O problema vem de décadas e mudar essas verbas, que já são
deficitárias, não deve ajudar", disse Julita Lemgruber, coordenadora do
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes e
ex-diretora-geral do sistema penitenciário do Estado do Rio.
Além
da previsão de usar as verbas para "políticas de redução de
criminalidade", a minuta da Medida Provisória fala na possibilidade de
transferir até 30% do Funpen para Estados no âmbito da execução do Plano de
Segurança, "para pagamento de diárias especiais de jornada extra e horas
extras para policiais militares, civis ou de peritos oficiais."
O
Ministério da Justiça abriu nesta semana edital de convocação de 7 mil
policiais militares da reserva para compor o reforço que será destinado aos
Estados no combate aos homicídios - o País registrou 58.492 assassinatos em
2015. O aumento da tropa da Força Nacional, que hoje tem 1,5 mil homens e
mulheres, demandará esforço financeiro para as diárias.
Transparência.
O
secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, demonstrou
preocupação com a possibilidade de transferências diretas. "O que não se
pode perder é a transparência, que é maior com os convênios. Com Estados e
municípios quebrados, temo que a verba acabe sendo usada para outras
finalidades, comportamento que tem precedentes nos últimos anos", disse.
Em
nota, o Ministério da Justiça disse que a "posição sobre o tema será
anunciada à época do lançamento" do plano.
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